Capítulo 12.5
Desilusão
O que fazer quando os castelos começam a ruir?
O que fazer quando no eterno espetáculo de dança, que é a vida, a música para, e todos te deixam sozinha no salão?
Eu não sei, e não sei se ainda vou descobrir. Parece que a única coisa a se fazer é ficar sentada, chorando, enquanto você espera um príncipe encantado salvá-la. Afinal, é pra isso que existem as princesas, não é?
Para serem frágeis e impressionáveis. Não é?
Mas e se as coisas não são contos de fadas? E se príncipes, afinal de contas, não existem? E se os dragões estão por aí na forma de pessoas, que não cospem fogo, mas fazem tantas coisas mais terríveis? Porque é isso o que está acontecendo.
Por outro lado, quando eu estava deitada, via Calem segurando minha mão. Ele estava amedrontado também, mas tentava ser mais forte que eu. Ele tentava fingir que estava tudo bem, que tudo ficaria bem, só que eu não acreditava. Em tantas coisas acreditei , e as juntei em um grande castelo de vidro ao longo da minha vida. E em questão de momentos, minutos, instantes, o vidro se estilhaçou em milhares de pedaços.
Como pode, você se sentir tão único, e depois, de repente, perceber que é só mais um? Uma partícula insignificante, apenas um peão no imenso tabuleiro de xadrez universal. E quando você percebe que não tem poder algum, que em curtos instantes você deixa de ser mais um nesse mundo, e parte para outro, de repente se torna difícil acreditar que pode fazer qualquer coisa.
De repente, o corpo que você luta tanto para proteger, torna-se apenas um objeto. Os pensamentos, que você tanto cria, de repente saem voando sem qualquer indício de retorno. O mundo sempre foi esse?
Ou eu nunca o enxerguei assim?
Meu pai, afinal de contas, estava certo, talvez. Talvez eu nunca devesse ter deixado Vaniville. Eu estaria atrás daqueles portões. Não teria passado por nada. E nunca teria descoberto que o mundo realmente não era uma festa eterna. De repente, as luzes se apagam, e os convidados vão embora, sem qualquer aviso. E só te resta se conformar, e se preparar para aquilo que não está preparado.
Tantas coisas boas estão apenas tentando camuflar as coisas ruins. Por que não colocar uma torre linda e iluminada em uma cidade repleta de maus elementos? De repente, quando você anda em uma multidão, pensa em quem são aquelas pessoas. O que cada uma delas esconde. Você sempre vai encontrar algo sombrio, será? Existem pessoas totalmente boas, afinal?
Eu fiquei repleta de enigmas depois daquilo. Mas o maior de todos ainda era o Charlie. Quem era o Charlie? Pelo que o Charlie havia passado? Ele se deparou com coisas piores que eu, mas conseguia rir de tudo? Por que ele sempre ria? A desgraça lhe era divertida? Calem estava certo, e eu não devia te confiado nele, será?
Afinal, o que dá numa garota para decidir se arrastar pelo mundo com alguém que acabara de conhecer? Como fui estúpida. Calem estava certo. Mas agora não posso simplesmente mandar Charlie embora, depois de tudo isso. Talvez eu deva ser estúpida de novo e dar-lhe mais uma chance. Levá-lo a um lugar mais seguro, e então deixá-lo, talvez.
Ele está me olhando. Ele está disfarçando, mas eu sei que está me olhando. Pelo reflexo da janela. Talvez ele se sinta extremamente culpado pelo que aconteceu comigo. Sei que se sente, mas eu não posso deletar o que aconteceu de minha mente. É como se tudo tivesse sido gravado, e quando eu fecho os olhos, só consigo ver as mãos se aproximando de mim.
Besteira, talvez. Afinal, nada aconteceu. Mas o que podia ter acontecido? Por que tiraram minha roupa? Algo tão privado, de repente pareceu algo simples aos olhos daquelas pessoas. Me sinto culpada por ter seguido Charlie, apesar de tudo. Por que nada faz sentido mais na minha cabeça?
Por outro lado, embora eu esteja com tanto medo, é como se dentro de mim eu não quisesse abandonar tudo. Algo me diz que ainda vale a pena viver, mesmo pelas coisas ruins. Eu não sei mais o que ouvir, não sei. Talvez só amanhã as coisas façam sentido. Meus olhos coçam pelas lágrimas secas, e minha mão está quente de tanto que Calem a segurou. Ele vai tentar dormir, e talvez eu deva também. Só espero que as coisas façam sentido.
Tantas coisas ruins me podem acontecer, mas será que também não existem coisas boas?
Serena